A qualidade educacional: outra manifestação da desigualdade
Por Ernesto Espíndola, Daniel Valencia, Guillermo Sunkel.
A América Latina está bastante atrás, comparada aos países desenvolvidos, no que se refere à obtenção das competências necessárias para uma pessoa se desenvolver plenamente na sociedade do conhecimento. Uma das características principais dos sistemas educacionais da região é o alto grau de segregação escolar, ao que se somam diversos problemas que afetam o desempenho docente e o clima escolar. Isso reforça a já marcada transmissão intergeracional das oportunidades educacionais que, na região, reproduz a estrutura da desigualdade social dentro do sistema educacional (veja CEPAL, 2004).
Os atuais debates sobre a qualidade da educação à qual os e as jovens têm acesso e a aprendizagem que eles alcançam têm deixado em evidência que as competências e habilidades que estão sendo adquiridas por meio do sistema educacional ainda é deficiente, o que põe em risco a possibilidade de os e as jovens terem um bom desenvolvimento em suas vidas no futuro, e de transformação da sociedade atual em uma que seja cada vez mais equitativa, igualitária, inclusiva e sustentável.
Nos diversos estudos realizados sobre o tema, tem se assinalado que vive-se atualmente o que se poderia chamar de uma “crise da aprendizagem”, porque ainda existe no mundo uma grande quantidade de jovens que não conseguem adquirir as competências básicas, como matemática e linguagem, tampouco outras competências e habilidades necessárias para o desenvolvimento de suas vidas no século 21, como as relacionadas a uma boa educação cívica ou o correto uso das tecnologias da informação e da comunicação (TIC), entre outras. Em tais pesquisas, foi posto em discussão que tal crise deve-se a diversos fatores, como a qualidade da formação do corpo docente, o material educacional usado, a infraestrutura das escolas e também o sentido da educação e o modo de ensino e aprendizagem que as escolas estão executando atualmente.
Um dos aspectos que hoje são relevantes com relação à educação que os e as estudantes recebem e sua aprendizagem está vinculado ao surgimento das TICs (1) no âmbito educacional. É inegável que as TICs penetraram tanto o âmbito educacional como outras esferas da vida dos e das jovens. As premissas centrais mencionavam que o surgimento das TICs poderia contribuir tanto para gerar condições e resultados de aprendizagem melhores, como também para diminuir as inequidades existentes nos sistemas educacionais. Entretanto, diversos estudos têm constatado que as promessas associadas às TICs no âmbito educacional não estão sendo cumpridas da maneira que se pensava e, apesar da diminuição nas diferenças do acesso às TICs por parte dos e das jovens, tanto no nível dos domicílios quanto dos estabelecimentos educacionais, tem surgido o que se chamou de a “segunda brecha digital”, que condicionou, de certa forma, o melhor aproveitamento e a apropriação das TICs porparte dos e das jovens para o alcance de resultados signifcativos na aprendizagem e no desenvolvimento de suas vidas.
E essa crise da aprendizagem se encontra condicionada e aprofundada pela desigualdade social. Desse modo, nem todos os e as jovens vivem os processos de aprendizagem ou essa crise de forma similar, pois fatores como nível socioeconômico, gênero e condição étnica/racial condicionam os resultados da aprendizagem alcançada, a qualidade da oferta educacional à qual os e as estudantes têm acesso e uma melhor apropriação e uso das TICs.
Ernesto Espíndola, Daniel Valencia e Guillermo Sunkel trabalham na Divisão de Desenvolvimento Social da CEPAL. Este texto apresenta parte do estudo O direito a uma educação de qualidade nas sociedades ibero-americanas, realizado a partir de um acordo com a Fundação SM. A pesquisa pode ser encontrada na íntegra no Observatório da Juventude Ibero-Americana.
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Atualmente, o conceito de tecnologias digitais tem sido usado com mais frequência, o qual alude a um conjunto amplo de aplicações que englobam o tratamento da informação, aprendizagem de máquina, inteligência artificial, automatização, robotização e nanotecnologias, entre outras.