O cérebro adolescente: como desenvolver as funções executivas durante o ensino fundamental

12 setembro 2017

A adolescência, um período de transformações

A adolescência é uma etapa de desenvolvimento e transição rumo à vida adulta, que se caracteriza por um ritmo acelerado de crescimento. Durante o seu desenvolvimento, ocorrem transformações neurológicas, cognitivas e socioemocionais, além de uma maturação física e sexual. Todas essas experiências incluem a transição para a independência social e econômica, o desenvolvimento da identidade, um aumento do egocentrismo, a aquisição das aptidões necessárias para estabelecer relações nos grupos e a prática de papéis.

1. Construção da identidade

A maioria dos estudantes entre 12 e 18 anos mostra uma identidade difusa ou ainda sem concretização. Segundo um estudo clássico realizado por Philip Meilman (1979), somente aos 21 anos a maioria dos sujeitos alcança  statusde identidade em fase exploratória ou de conquista da identidade, após realizar uma análise em sujeitos entre 12 e 24 anos.

Identidade confusa – Identidade imposta por outro – Conquista da identidade – Identidade em fase exploratória

2. Aumento do egocentrismo

Segundo Díaz-Aguado (2008), o egocentrismo durante a adolescência se manifesta por meio de diversos fenômenos cognitivos e emocionais como a fábula pessoal, a audiência imaginária e o sentimento de invulnerabilidade: 

  • fábula pessoalé uma história que os adolescentes contam para si mesmos, baseada no convencimento de que a sua experiência pessoal é especial e única.
  • Audiência imaginária: Quando, irrealmente, os adolescentes consideram que os demais prestam tanta atenção ao seu aspecto e à sua conduta quanto eles mesmos.
  • sensação de invulnerabilidadeé uma distorção cognitiva que poderia estar na base das condutas de risco em que alguns adolescentes se envolvem, pensando que as consequências mais prováveis de tais condutas não podem acontecer com eles porque são especiais.

Por meiodo grupo de iguais, os adolescentes aprendem a colocar em perspectiva e a relativizar o que está acontecendo com eles, assim como a intensidade emocional que isso produz.

3. Orientação para os iguais e conformidade com a pressão do grupo

Durante a adolescência, ocorre uma transformação e aumento da aprovação dos iguais e do tempo que passam com eles.  No início da adolescência, formam turmas auto-segregadas por sexo, meninos e meninas separados. À medida que entram na puberdade, as turmas de meninos e meninas, que inicialmente tinham se movimentado em paralelo, porém separadas, começam a se juntar e a compartilhar tempo e espaço. Os adolescentes são altamente suscetíveis à pressão do grupo, à influência dos iguais a aceitarem a sua conduta e atitudes. Uma das causas do incremento das condutas de risco que se produz na adolescência inicial é a forte vulnerabilidade à pressão do grupo de companheiros. Esta pressão aumenta desde os últimos anos do ensino fundamental e tende a diminuir a partir dos 16 anos, principalmente quando o indivíduo dispõe de suficientes oportunidades para estabelecer relações adequadas com grupos de companheiros que não incorrem com uma especial frequência em condutas de risco (Díaz- Aguado, 2008).

4. Maturação tardia do córtex pré-frontal

O desenvolvimento do córtex cerebral durante a adolescência começa na parte posterior do cérebro (lóbulo occipital, parietal) e finaliza, durante a adolescência tardia, com o desenvolvimento do lóbulo frontal. Dentro desse lóbulo, encontra-se o córtex pré-frontal, no qual estão as áreas cerebrais mais relevantes envolvidas nas funções executivas. Também é responsável pelo controle dos impulsos. Esta zona é biologicamente imatura durante a adolescência, favorecendo a aparição de um maior nível de impulsividade. Um indivíduo com o córtex pré-frontal completamente desenvolvido será capaz de inibir o desejo de atuar quando se produzam emoções, por exemplo, de ira no cérebro. Na seguinte imagem, a cor vermelha indica mais massa cinzenta e a azul, menos massa cinzenta. A massa cinzenta diminui da parte posterior para a anterior à medida que o cérebro matura e as conexões neurais sofrem uma poda.

En esta infografía del cerebro, el color rojo indica más materia gris y el color azul menos materia gris.
Origem: Paul Thompson, Ph.D. UCLA Laboratory of Neuroimaging

Uma combinação das características expostas anteriormente (um egocentrismo elevado, falta de maturidade do córtex frontal, pressão do grupo ou difusão da identidade) pode favorecer a aparição de condutas de risco durante a adolescência.

Adolescência: um período de transformações

Como desenvolver as funções executivas durante o ensino fundamental

O desenvolvimento das funções executivas é fundamental durante a maturação do cérebro, favorece o controle por meio do estabelecimento de metas e do planejamento. Durante a adolescência, as habilidades das funções executivas ainda não possuem os níveis de um adulto, mas as demandas, frequentemente, são similares. Os adolescentes precisam se comunicar efetivamente em diversos contextos, administrar as suas próprias tarefas escolares e extracurriculares e completar com sucesso projetos mais abstratos e complicados. A seguir, gostaríamos de destacar uma série de atividades, que permitem reforçar os três tipos de funções executivas mais estudadas: a memória de trabalho, a flexibilidade mental e o autocontrole, resumidos a partir da informação proposta pelo site Center on the Developing Child de Harvard University.

A seguir, apresentamos algumas sugestões para ajudar os adolescentes a melhorarem a sua autorregulação ao longo dos desafios diários que enfrentam

Estabelecimento de metas, planejamento e monitoramento

  • Para enfocar o processo de planejamento, anime os adolescentes a identificarem algo específico que queiram conquistar. O mais importante é que os objetivos sejam significativos para o adolescente e não estabelecidos por outros. Começar com algo bastante simples e alcançável, como obter a carteira de motorista ou economizar dinheiro para comprar um computador, antes de passar para metas mais complexas.
  • Ajude os adolescentes a desenvolverem planos por passos para alcançar estes objetivos. Devem identificar objetivos a curto e longo prazo e pensar no que deve ser feito para consegui-los. Por exemplo: se os adolescentes querem que a sua equipe ganhe o campeonato ou a liga da qual participam, quais habilidades eles necessitam aprender? Como poderiam praticá-las?
  • Fale para os adolescentes supervisionarem periodicamente o seu comportamento e considerarem se estão fazendo o que planejaram e se estes planos estão contribuindo para a conquista dos objetivos que identificaram. É parte do plano? Se não, por que estou fazendo isso? Algo mudou? O monitoramento desta maneira pode identificar ações contraproducentes habituais e impulsivas, e manter a atenção focada e o controle consciente.

Ferramentas para automonitoramento

  • A autoconversação é uma maneira poderosa de trazer consciência para pensamentos e condutas. Os exemplos incluem que os adolescentes falem a si mesmos por meio dos passos de uma atividade difícil ou pausando periodicamente para um relato mental de jogo por jogo do que está acontecend. Quando as ocasiões provocam fortes emoções negativas ou sentimentos de fracasso, a autoexpressão pode ajudar os adolescentes a identificarem padrões potencialmente problemáticos de pensamento e conduta.
  • Ajudar os adolescentes a serem conscientes das interrupções (particularmente das comunicações eletrônicas, como o e-mail e os telefones celulares). A multitarefa pode fazer se sentir bem, mas existe uma forte evidência de que diminui a atenção e impede o rendimento. Se duas (ou mais) tarefas competem pela atenção, discuta com eles as maneiras de priorizar e sequências para a sua execução.
  • A compreensão das motivações dos demais pode ser um desafio, especialmente quando as pessoas se sentem impulsionadas por diferentes perspectivas. Anime os adolescentes a identificarem as suas hipóteses sobre as motivações dos demais e, em seguida, a considerarem alternativas. Você pode pensar em outra explicação?
  • Escrever um diário pode fomentar a redação sobre si, proporcionando aos adolescentes um meio para explorar pensamentos, sentimentos, ações, crenças e decisões. Existem muitas maneiras de abordar o diário, mas todas fomentam a autoconsciência, reflexão e planificação.

Atividades

Existem muitas atividades que os adolescentes podem desfrutar que se baseiam em uma gama de habilidades de autorregulação. O segredo é enfocar na melhoria contínua e no desafio crescente. A seguir, são indicados alguns exemplos:

  • Esportes– A atenção focada e o desenvolvimento de destrezas inerentes aos esportes competitivos se baseiam na capacidade de monitoramento das ações próprias e das alheias, de tomar decisões rápidas e de responder à exibição para jogar. A atividade aeróbica contínua e desafiante também pode melhorar a função executiva.
  • Yoga e meditação– Atividades que apóiam um estado de atenção plena ou uma consciência não judiciosa do momento – podem ajudar os adolescentes a desenvolverem uma atenção sustentada, reduzir o estresse e promover tomada de decisões e comportamentos menos reativos e mais representativos.
  • Música– A memória de trabalho, a atenção seletiva, a flexibilidade cognitiva e a inibição são desafiadas ao desenvolver habilidades para tocar um instrumento musical, cantar ou dançar, especialmente quando se trata de peças complicadas que implicam diversas partes, ritmos sofisticados e improvisação.
  • Teatro– Uma atuação contém uma cuidadosa coreografia e requer que todos os participantes, no palco e detrás dele, lembrem dos seus trabalhos, assistam ao seu tempo e controlem o seu comportamento. Para os atores, a aprendizagem das linhas e ações de um papel se baseia, em grande medida, na atenção e na memória de trabalho.
  • Jogos de estratégia e quebra-cabeça lógicos– Os jogos clássicos, como o xadrez, e programas de treinamento baseados em computadores, exercitam aspectos da memória de trabalho, planejamento e atenção.
  • Os jogos virtuais também podem ser valiosos, sempre que forem estabelecidos e observados os limites de tempo. Transitar por mundos imaginários complicados, como os que se encontram em muitos jogos virtuais, também desafia a memória de trabalho.

Habilidades de estudo

Na escola, espera-se que os adolescentes sejam cada vez mais independentes e organizados no seu trabalho. Estas expectativas podem colocar uma grande carga em todos os aspectos da função executiva. As habilidades básicas de organização podem ser muito úteis neste sentido. A lista, a seguir, pode servir de guia para os adolescentes.

  • Dividir um projeto em peças manipuláveis.
  • Identificar planos regulares (com prazos) para completar cada parte. 
  • Automonitoramento enquanto trabalha. Ajustar um temporizador para que se apague periodicamente como um lembrete para comprovar se está prestando atenção e compreendendo. Quando você não entende, qual poderia ser o problema? Existem palavras que você não conhece?  Tem alguém que pode ajudar você? Se você deixou de prestar atenção, o que foi que te distraiu? O que poderia ser feito para focar? Identifique os tempos fundamentais para automonitorar (por exemplo, antes de entregar um trabalho, ao sair de casa, etc.).
  • Seja consciente dos momentos críticos para manter a concentração. A multitarefa impede a aprendizagem. Identifique maneiras de reduzir as distrações (por exemplo, apagar os dispositivos eletrônicos e manter o quarto em silêncio).
  • Mantenha um calendário com os prazos e passos do projeto ao longo do caminho.
  • Depois de completar uma tarefa, observe o que funcionou e não funcionou bem. Desenvolva uma lista de coisas que ajudaram a manter a atenção focada e sustentada, assim como uma boa organização, memória e finalização do projeto. Pense em maneiras de assegurar que estes apoios estejam no lugar para outros projetos.
  • Pense no que aprendeu das disciplinas que não foram bem completadas.Foi devido à falta de informação, à necessidade de melhorar certas habilidades, à má gestão do tempo? Da próxima vez, o que você mudaria?

Referencias

*Conteúdo publicado originalmente na versão do EDUforics em espanhol.